Conversamos com o líder do
estudo Fabio Iocco, italiano pesquisador do Instituto
Sul-Americano de Pesquisa Fundamental (ICTP-SAIFR) e do Instituto de
Física Teórica da Unesp. “Gostamos de considerar isso como um
primeiro passo”, disse. Depois de terem respondido com segurança a questão
fundamental que é a existência de matéria escura próxima da Terra, Iocco e sua
equipe pretendem em breve fornecer mais detalhes sobre a substância misteriosa
em um outro artigo.
Confira a íntegra da entrevista com o pesquisador:
O senhor poderia explicar brevemente o método utilizado
para determinar a presença de matéria escura na parte interior da Via Láctea? O método foi o mesmo que é usado em todas as galáxias
espirais – ele leva em conta a medida do movimento de rotação do centro da
galáxia toda, que medimos a partir da análise de gás e de estrelas. É
importante entender que, em galáxias espirais, a rotação está relacionada à
força gravitacional. Para medir este movimento é preciso determinar o total de
força gravitacional agindo em um ponto, e então calcular a massa total que está
dentro da galáxia. Portanto o total de força gravitacional é dado a partir da massa
total. Quando comparamos esta massa com a massa das estrelas e do gás que
vemos, percebemos que existe uma discrepância entre as duas. Então deve existir
alguma massa, alguma coisa que exerce gravidade, mas não é visível. Não é
estrela, não é gás, também não se trata de pequenos buracos negros ou outras
coisas do gênero. Logo, deve ser aquilo que chamamos de matéria escura, que não
interage com a luz de nenhuma forma, nem mesmo cria uma sombra. Não é que não
esteja brilhando, simplesmente não há interação.
De que
formas este tipo de matéria influencia na dinâmica de nossa galáxia? Ao todo, a matéria escura compõe a maior parte da massa da
galáxia. Na região que fizemos as medições, que é uma grande porção da galáxia
visível, existe mais ou menos a mesma quantidade dos dois tipos de matéria. Por
isso é tão difícil de medir, pois a quantia é parecida, então o efeito da
matéria escura ali é menor do que no resto da galáxia. É preciso ter medições
muito precisas para determinar sua presença, do que nós dispúnhamos, e este é o
motivo de nosso estudo ser tão novo. Nós conseguimos determinar nesta região um
componente que não é dominante, mas sim mais ou menos comparável às estrelas
visíveis. Ele afeta a dinâmica na medida em que podemos medi-lo, mas não interage
com as estrelas. Se a pergunta for: “a matéria escura cria estrelas?”, a
resposta é não, ela não faz nada, é inerte. Ela apenas contribui para a
gravidade e um pouco para a rotação nesta região.
Existe
matéria escura no espaço intergaláctico, ou ela se concentra apenas no interior
das galáxias? Ela está
basicamente por toda parte no universo, distribuída. Nas galáxias existe uma
maior concentração, mas isso porque ela cria potencial gravitacional que atrai
gás. De certa maneira, a matéria escura permite a formação da galáxia, porque o
gás é atraído por este potencial e então forma as estrelas. Portanto existe
matéria escura dentro de uma galáxia e também entre uma galáxia e outra, mas
neste espaço ela é menos concentrada do que no interior galáctico. No entanto,
a substância compõe a maior parcela da massa de aglomerados de galáxias, por
exemplo, como o Aglomerado Bala. Apesar de ser abundante ali,
ainda assim é menos densa do que nos interiores.
O senhor e
seus colegas demonstraram a existência de matéria escura na Via Láctea, mas não
sua distribuição. Por quê? É
claro que nós vamos fazer esta parte, na verdade já estamos fazendo, e ela será
publicada em outro artigo. A razão é que na literatura existem muitos estudos
mostrando a abundância da distribuição de matéria escura, mas no geral, para se
obter esta distribuição, é preciso confiar, em certa medida, em uma suposição
sobre a forma da substância. Com isso se acha unidade e pode-se trabalhar com
as concepções. Entretanto, a quantidade descoberta é tão válida quanto sua
suposição inicial. Neste estudo, queríamos provar, além de qualquer dúvida
razoável, que a matéria escura estava lá. Então não fizemos suposição nenhuma,
seja quanto a sua presença, ou quanto sua distribuição. Nossa intenção era
manter o conteúdo do estudo mínimo. Trata-se realmente de uma resposta à mínima
pergunta: existe ou não existe? A resposta é: existe, além de qualquer dúvida
razoável. É claro que, com os dados que coletamos, podemos dar uma resposta
mais precisa sobre como é a forma, e nós vamos fazer isso no mês que vem, mas
neste estudo nós realmente quisemos ser clean.
Há décadas
sabemos da existência de matéria escura, mas continuamos sem entender direito
sua natureza. O senhor acha que a descoberta de que a substância existe tão
perto de nós irá ajudar neste entendimento? Sim. Algumas considerações importantes: a primeira é que existem
muitas possibilidades para o que é a natureza da matéria escura, e existem
experimentos tanto na Terra quanto no espaço para avaliar a possibilidade de
que partículas de matéria escura se aniquilam no céu e então nos mandam uma
mensagem. Estes experimentos precisam inicialmente da densidade da substância.
Especialmente os telescópios olham para o centro da galáxia. O fato de estarmos
vendo que existe matéria escura ali certamente fornece um primeiro material. No
futuro, como dizia, vamos delimitar a exata distribuição da matéria escura,
isso vai diminuir as incertezas sobre esta questão e auxiliar nos experimentos
que podem levar à determinação de sua natureza. Nossos resultados
definitivamente vão ajudar. Existem também questões como se influencia ou não
na formação de galáxias, quanto de matéria escura existe no centro, se ela é
fria ou quente. O fato de saber que ela está lá e, no futuro, estabelecer
exatamente quanto está lá, também vai nos ensinar algo sobre a formação de
nossa galáxia. Gostamos de considerar isso como um primeiro passo.
Fonte: Galileu
Fonte: Galileu
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